Mágica em sala de aula


29/05/2019

bmagic

Mágica em sala de aula

Uma citação de Flávio Koutzii, lembra nosso entrevistado de hoje, Everton Carvalho: “nossos braços e as nossas pernas são de abrir caminhos”.

Everton abre caminhos. Seja na mágica ou em sala de aula.

Professor nato, ele trabalha em um projeto que teve início pensando a Mágica como ferramenta no ensino de História e acabou se ampliando, criando uma gama de possibilidades testadas em vários níveis escolares. A mágica sendo usada em oficinas de alfabetização paras os anos iniciais, passando pela aplicação da fábula no ensino fundamental e médio até a criação de jogos para turmas de no ensino fundamental e do EJA.

Recentemente, ministrou o curso de formação para educadores populares, por meio da mágica, fabulação e gamificação, com intuito de pensar cada vez mais novas ferramentas para o ensino.

A seguir, a entrevista sobre as mágicas no ambiente escolar. Confira!

Sabemos que as crianças estão crescendo na Era Digital e, por isso, têm maneiras diferentes de pensar, comunicar e aprender. Como a mágica atinge esse aluno nativo digital e como tu percebes isso em sala de aula?

Com a constante evolução tecnológica e a carga de informações recebidas pelos alunos por conta das redes sociais, sites de notícias, aplicativos e vídeos oriundos da internet, o Professor passa, cada dia mais, a ser um mediador do conhecimento. Aquele que irá mostrar aos alunos qual caminho deve seguir nesta busca incansável por informações, auxiliando assim na busca por fontes coerentes e instruindo a forma de analisar e debater estas informações em sala de aula, no seu convívio social ou até mesmo na geração de mais informação a ser replicada nas redes sociais.

A utilização da mágica em meio a este processo de aprendizado serve como um ótimo objeto de fixação de conteúdos, tendo em vista que ao elucidar a História ou demais matérias curriculares utilizando a Mágica, os efeitos apresentados em sala de aula, não somente serão lembrados por conta do seu encanto mágico, como também por todo o contexto presente em meio à criação textual apresentada junto ao simbolismo da ilusão demonstrada aos alunos.

Por quê escolheste a mágica como ferramenta em sala de aula?

A Mágica é uma arte milenar que há séculos vêm encantando o público e trazendo consigo diversos estudos relacionados à mente humana e as nossas habilidades cognitivas. Recentemente áreas que se dedicam ao ensino das ciências exatas começaram a esboçar o princípio de algumas pesquisas relacionadas à utilização da mágica em sala de aula, a maioria delas está ligada a Cartomagia (mágica com cartas) por se tratarem em sua grande maioria números com relações a expressões matemática.

Sabe-se que já existem muitos estudos sobre o uso de outras artes na educação, teatro e a música estão presentes o tempo todo em locais de difusão do conhecimento e muitos apontam até mesmo a retórica do professor em sala de aula como um processo muito semelhante à de um ator em cima do palco. A escolha da Mágica se dá por conta de sua representação e seu potencial para marcar um momento, seja ele através de um simples efeito mágico ou de um conto em meio ao ato Mágico.

Darwin Ortiz em "La Buena Magia" faz uma interessante reflexão onde relata que todas as vezes que ele mesmo pega um baralho e surpreende o público com uma ilusão, isso fica guardado para sempre na memória do espectador e então todas as vezes que este espectador avistar novamente um baralho, seja para jogar ou simplesmente avistar cartas em uma loja, logo fará uma relação instantânea de memória com o número apresentado por Ortiz. Este talvez seja o nosso ponto crucial na escolha da mágica como método de ensino, imagine uma história contada através de cartas ou de qualquer outro instrumento do cotidiano que possibilite o ato mágico, onde nós enquanto professores iremos estabelecer estas relações entre o número e o conteúdo, certamente ao se deparar novamente com estes objetos o aluno prontamente irá estabelecer um fluxo de relações em sua memória que trará este conteúdo aprendido novamente à tona.

A utilização da mágica como um processo pedagógico em meio ao ensino não exclui obviamente a utilização de outras metodologias, assim como música, teatro e jogos. Sua utilização é uma forma de complementar e tornar as aulas ainda mais atrativas.

Com todos os procedimentos teóricos ligados a didática já estabelecidos foi o momento então de colocar em prática um pouco destes saberes.

No inicio do ano de 2017 pude estar a frente de duas turmas do sétimo ano do ensino fundamental em uma escola do município de Alvorada/RS. O trabalho fez parte de um dos estágios realizados em meio ao curso de História, mas a pedido da direção da escola e com consentimento da instituição universitária, pude permanecer mais tempo do que o período definido pelo estágio, o que me trouxe a oportunidade de experimentar as ferramentas que até então se encontravam apenas no papel.

Começou então o processo de criação de rotinas, ou seja, elaboração de textos que se adaptassem às mágicas e que fossem de fato aplicáveis em sala de aula e para minha surpresa várias ideias e temáticas começaram a surgir.

Tive a oportunidade, então de colocar em prática três rotinas mágicas ligadas a ao conteúdo de História: a temática feudal e também a ancestralidade dos povos ameríndios, e os resultados foram os melhores possíveis. Obtive a comprovação, ao menos naquelas turmas, de que estas relações entre a mágica e a memória, foram de fato criados e todas as vezes que nós tratávamos de determinados assuntos eles imediatamente lembravam dos efeitos mágicos que haviam visto em aula. Criavam então uma relação com o conteúdo apresentado.

Existe fórmula mágica em sala de aula? E qual a mágica para estimular o aprendizado?

Ao ser desafiado por um ativista social que gerencia cursinhos pré-vestibulares populares, chamado Rafael Freitas, fui instigado a criar uma palestra para professores falando um pouco sobre o que eu penso sobre a sala de aula. Essa pergunta me veio em mente, então decidi me dedicar a fazer relações sobre o ato mágico e a sala de aula e me deparei, com surpresa, com muitos pontos semelhantes entre a arte da ilusão e a arte do ensinar.

Para estabelecer tais relações eu precisava de um teórico mágico e fui buscar em um dos meus grandes ídolos, o mágico espanhol Juan Tamariz, a base para que pudesse então desenvolver um material que fosse eficiente no palco e em sala de aula. De Juan Tamariz, me debrucei em seus escritos sobre “Os Cinco Pontos Mágicos”.

Estes pontos estão divididos em: Olhar, Voz, Mãos, Corpo e Pés e trazem um panorama geral do comportamento do mágico diante de seu público. Transferindo esta teoria para a sala de aula, conseguimos também um panorama sobre a ação do professor diante de uma turma. Para os mágicos todas as vezes que se sobe ao palco se representa ali a melhor pessoa que você pode ser e não é diferente para os professores que quando estão a frente de uma sala de aula, são ali a melhor representação de si para então obterem sucesso em ambas as situações.

A divisão destes pontos e o desmembramento deles torna possível a reflexão sobre o nosso comportamento diante dos alunos, assim como tornou possível a reflexão sobre a prática mágica, este material escrito por Tamariz e aplicado por mim aos professores, nos mostra o quanto pequenos detalhes podem alterar o rumo de um show ou de uma aula e o quanto as ações desta duas profissões, por vezes tão distintas, estão interligadas e podendo assim o mágico encantar pela ilusão e o professor encantar pela transmissão do conhecimento.

Muito obrigado BMagic, vocês possibilitam que mágicos e espectadores continuem sonhando e se encantando com esta arte milenar, nestes tempos difíceis que a ilusão de um ato mágico nos conforte e nos faça sonhar e imaginar novos horizontes de um mundo mais igual onde não haja preconceitos e que todos possam através da cultura se libertar!